domingo, 16 de dezembro de 2007

Vamos parar para ouvir a voz do Centro

Fui ao Centro da cidade ontem à tarde com minha mãe. Sempre que se vai ao Centro, algo precisa ser adquirido, na maioria das vezes; comigo não foi diferente. Período de Natal e aquela confusão. Confraternização mesmo só em casa, com roupa nova e ceia com peru e coca-cola. Nas ruas do Centro, a lei é passar na frente pra chegar logo na C&A, acotovelar as pessoas e esculhambar aquelas que ficam estateladas no meio da rua, seja tomando casquinha do Duda's Burger [que custa R$ 0,99 e é uma droga] ou namorando as TVs de LCD nas vitrines da Insinuante.

Eu e minha mãe passamos um pouco longe dessas intenções - muito embora a rainha do meu lar, aqui e alí, parasse para ver o preço dos DVDs. Fomos na rua Pedro Pereira, famosa por suas lojas de artigos eletrônicos, comprar a bateria do telefone sem fio. Aproveitei para inaugurar meu cartão de crédito novo [artigo maldito que acaba com as nossas finanças, mas que já me tirou do sufoco no paranóico aeroporto de Heathrow, em Londres].

Mãe teve que resolver outros problemas e me largou sozinha no Centro. Confesso que fui namorar as câmeras digitais, mas numa rua menos movimentada, para não ser alvo das pragas do povo, e comprar chinelo de dedo de R$ 10 naquelas lojas de calçados da Floriano Peixoto. Novamente, saco a arma mais perigosa da minha bolsa: o cartão - a essas alturas, sem peso na consciência. Depois, fui comprar um mini dicionário de português, porque todo jornalista que se preza tem que estar em dia com a língua materna.

Com minhas sacolinhas, fui para a Praça do Ferreira. Eram quase duas da tarde e eu procurava um lugar à sombra para sentar. Os bancos da praça estavam lotados, entre quem, atufalhado de pacotes, parou para descansar e quem jogava conversa fora. Quando encontrei espaço, sentei e parei de pensar. Sozinha, não tinha livro para ler e achei por bem [não por precaução] não pegar o mp3. Simplesmente, achei melhor ficar ouvindo o Centro. O arrastar das chinelas no chão de pedra e o farfalhar das sacolas de compras eram constantes. Meninos e homens nos olhavam nos olhos de quando em vez, seja pedindo uma ajuda ou vendendo marujinho.

As duas amigas do meu lado conversavam sobre a despedida de uma delas - chamada Cecília, a propósito - do emprego. Os dois vendedores da Insinuante, do outro lado, fofocavam do amigo que namorava uma garota só porque ela o sustentava. "Eu só namoro uma menina se eu achá-la bonita e interessante", disse um deles, orgulhoso de sua índole. Também falavam mal de um pedinte, que sempre fica deitado sobre um pedaço de papelão enfrente ao Cine São Luiz, hoje SESC Luis Severiano Ribeiro, julgando-o mentiroso e farsante.

Naquele banco lotado, fiz-me de invisível para observar as pessoas que cruzavam a praça - gente de todos os jeitos -, todas tão donas de si, tão preocupadas com as compras de fim de ano que nem se davam conta de uma necessidade importante, que é a de falar e ouvir. Disso, toda cidade é diversa e, às vezes, a gente nem se toca.

Esqueçamos o barulho das sacolas e a zuada das lojas. Vamos parar para sentar nos bancos da Praça do Ferreira e falar da nossa rotina, das coisas que estão à nossa volta. Elas fazem parte de nós. O Natal passa, a correria passa, as roupas e sapatos se estragam. E nossa alma, como fica?

Um comentário:

Mocinha Falante disse...

Menina, e no fim das contas acaba sendo isso mesmo. Meio que a correria domina às pessoas e acho que lá na frente, no meio do caminho, elas devem parar e perguntar: por que diabos estou seguindo a multidão? Nem sei se isso existe, mas queria poder testemunhar uma cena dessas. Legal o blog, vou ficar vindo aqui de vez em quando ^^